quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

A Ninfa

Depois daquele bate papo com o Saci, ainda com a minha barriga doendo de tanto rir, fiquei pela sombra da velha Teca olhando os seres.
Uma ninfa me chamou muito à atenção, ela suspirava, triste, olhando pra baixo.
Voei pra perto dela e ela me olhou. Tinha olhos negros e grandes, cabelos compridos e uma roupa estranha feita de folhas secas.
-- Morri! Disse ela.
-- Eu também! Respondi
N-- É mas você é um passarinho e qualquer dia destes vai poder voltar.
D-- E você não?
N-- Difícil, né? Eu sou uma Dríade.
D-- O que é uma Driade?
N-- É uma ninfa que vive numa árvore. Cada árvore da Terra tem uma e quando ela morre a Dríade morre junto.
D-- Uh! Que chato! E como você morreu?
N-- De motosserra!
D-- O que é isso? Algum tipo de moto? O meu humano tem uma moto.
N-- Não! É uma arma humana usada para matar árvores.
D-- Nossa! Que maldade. E por que eles fazem isso?
N-- Para usar a madeira, o corpo da árvore.
D-- E eles usam para que?
N-- Sei lá! Eu nunca tinha visto humanos até aquele mês em que começaram a matar as grandes árvores lá da minha floresta.
D-- Os humanos são incompreensíveis.
N-- Contavam-nos as Dríades mais antigas, que alguns humanos faziam oferendas e pediam para os Grandes Espíritos das florestas que permitissem cortar uma árvore.
D-- E os Grandes Espíritos das florestas deixavam que se matasse Dríades?
N-- Aí é que estava o milagre, as Dríades não morriam, elas podiam ter filhas.
D-- Não entendi.
N-- Assim, ó! O humano fazia oferendas e essas oferendas eram plantar sementes da árvore que seria derrubada no local. Aí a Driade recebia sementinhas de um Grande Espírito e concebia uma Driáde para cada mudinha que nascia naquele lugar.
D-- E ela não morria?
N-- Não, como eu morri, sofrendo a dor da motossera, mas fundia-se nas novas Dríades que iam despontando pelo chão.
D-- Nossa, que mágico.
N-- É!
D-- E com essa nova onda de pegada ecológica? A própria Mãe Terra espera que, no futuro, os humanos serão mais humanos e vão plantar mais árvores.
N-- É?
D-- É! Tipo assim! Eles sujam o ar do planeta pra viver e pagam pra plantarem árvores que, respirando, vão limpar a sujeira que eles fizeram.
N-- Ah!
D-- Então, foi numa entrevista que eu fiz com a Terra que fiquei sabendo dessa coisa aí.
N-- Então, tipo assim, eu vou poder voltar, talvez?
D-- Não sei, será que se você encontrar alguém da sua hierarquia que saiba a resposta, você não volta?
N-- Ai, tomara, viu?
D-- Tomara!

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Saci


Nas minhas voanças pelo aquém do além, em busca de sabença já que resolvi filosofar sobre o que me cerca, fui à biblioteca. Bom, na verdade não é bem uma BIBLIOteca, mas uma árvore chamada Teca, antiquíssima de mil idades, sob cujas sombras descansam os conceitos e criações da mente humana, mitos e demônios. Todos inofensivos nesta calma dimensão do planeta Terra.
Entre essas figuras todas, algumas até horrendas de olhar, lá estava pulando, assobiando e rindo muito, o Saci.
Cheguei sem pudor e falei:
-- E aí, Negrinho do Pastoreio?
-- Ih, olha aí, um azul brilhande de bico rosa, falante. Além disso, burro. O Negrinho do Pastoreio é aquele grandão alí de duas pernas.
-- Desculpe, confundi. Você é o Saci?
-- Saci sou seu criado, malcriado mas benéfico, do contrário das más línguas.
-- Seu Saci, dá entrevista pro meu blog?
-- Claro que dou, mas tem que colocar uma foto minha lá.
-- Certo, xacomigo! Vamos então, sentar alí naquela pedra?
-- Bamo!
DING: Saci Pererê! Onde você arranjou esse nome?
SACI: Veio do jeito dos escravos de falar, porque eu to sempre pulando, já que não dá pra andar reto de uma perna só. Vai que eles queriam dizer perereca e como eu vivia pererecando aqui e ali, ficou.
DING: Você é uma figura controversa, dizem que é maléfico, dizem que quem te pegar e guardar fica rico. O que você é?
SACI: Controversa o %*@§#! Eu só gosto de aprontar, apagar as velas, desandar feijão, espantar galinha e andar a cavalo.
DING: Cavalos! Os coitados quase enlouquecem quando você monta e assobia feito louco. Dizem que eles correm a noite inteira.
SACI: Não é bem assim, só os xucros é que fazem isso porque tem cócegas. Os mansos ficam quietinhos, vão andando e até pastam. Além disso, eu não deixo os morcegos vampiros chegarem neles.
DING: Aí, de manhã, o caboclo vai pegar o cavalo e ele tá com as crinas cheias de nós. É você quem faz?
SACI: É! (rindo) Mas, imagine eu, com este tamanhinho, com uma perna só, tenho que me agarrar a alguma coisa.Rárárárárárá
DING: Pois é, na televisão você ficava maior. Achei que você fosse grandão.
SACI: Não, pode ver que sou só um pouco maior que você. Na televisão só tinha aquele ator, por sinal muito bom, que tinha uma perna só.
DING: Você é um íncubo?
SACI: Não, claro que não, íncubo é aquele magrelão ali, de nariz comprido e asa de morcego, o apelido dele é Batman...rárárá!
DING: Perguntei isso porque os romanos acreditavam num íncubo chamado Pileus, que se fosse capturado daria riqueza.
SACI: Já ouvi falar, mas não conheço a figura.
DING: No Brasil de hoje você seria chamado como um afrodescendente portador de necessidades especiais? Kikiki
SACI: Rárárárárárá! Seria! E de menor impúbere e incapaz, também. Rárárá!
DING: Já te chamaram de Kilaino?
SACI: Tem índio que ainda chama, lá no Mato Grosso. Eles gritam: Kilaino! Kilaino! e eu grito de volta pros tontos se perderem. Rárárárárárá
DING: Sua risada parece a do Romário. Kikiki
SACI: Pode ser, mas o que eu faço com uma perna só ele não faz com as duas. Rárárá!
DING: E você é meio fanho também!
SACI: Ô passarinho, vc já ouviu sua voz? Seu pio parece um engradado de marrecos! Rárárárárárá
DING: Kikiki...tá bom. Mas eu atravesso água.
SACI: Atravessaaaa! Rárárárárárá Que eu sei, você já caiu em piscina e foi pescado.
DING: Como é que você sabe?
SACI: Porque eu sei de tudo o que é fofoca, é o meu trabalho, pô! Serviu a carapuça?
DING: E os redemoinhos, tem saci?
SACI: Às vezes tem, às vezes não tem. Rárárárárárá
DING: Tá rindo do que, ô bobão?
SACI: Da sua pergunta inocente, azul, eu sou lá idiota de ficar passando recado se eu tô ou não tô? A besta humana é tão besta que cria esse monte de figura que vem tomar sombra aqui na Teca, vai que tem algum seguidor seu, doido pra sair jogando cesta em redemoinho.
DING: Que nada, hoje eles capturam vocês com antivírus e firewall. Kikiki!
SACI: Captura nada! A gente somos mito. Eles não tem tecnologia pra isso.
DING: É! Mas já teve muito saci preso.
SACI: Não adianta, a gente não dá riqueza coisa nenhuma, o que dá é a crença dessas bestas humanas, aí eles modificam a matéria pensante, que solidifica a riqueza de acordo com a criação da mente tacanha deles. Depois, como acabam relaxando a guarda, a gente foge, apaga os lume, e, antes de sair, desanda o feijão.
DING: Como você faz pra desandar feijão?
SACI: Cuspe! Rárárárárárá
DING: Kikiki! E desanda?
SACI: Estraga mesmo. Comeu, vai peidar e ter cagança. Rárárárárárá
DING: Ai, ai, ai. Para que já to com dor de barriga. Kikiki.

(Na foto, criação do fabuloso Ziraldo)

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

De gansos, gatos e questões filosóficas

Pois é, aqui, do outro lado, os pássaros e aves são amigos de todos os outros animais. Lembra que eu disse que não precisa mais comer? Então, aqui tá cheio de gatos. Mas agora eles não caçam, só brincam e tiram sarro dos outros, ô bicho! Tudo Garfield!
Quem mais sofre com as piadas aqui são os poucos gansos. Dizem os gatos que ganso é piada pronta. (Perguntaram para um travesseiro de penas de ganso se ele tem pena de ganso e ele respondeu: Nao!) kikiki
Além disso tem aquela história malvada de afogar o ganso. Dos gansos daqui ninguém morreu afogado, é tudo trocadilho. Eles tem um comentário grasnado para quem faz esse tipo de humor negro com eles aqui: --Fóiengrasssssadinhos! kikiki
Galinha aqui tem pouca, acho que pouca gente ama galinha aí...você sabe do que estou falando, pode tirar esse sorriso maroto daí.
Bom, lá atrás eu falei que aqui é do outro lado, mas é força de expressão, não adianta você virar o pescoço que não vai enxergar o "aqui" aí, são lugares com comprimento de onda energética diferente das que os seus aparelhos podem captar, falou?
Você já ouviu falar de gente "alto astral"? Então é aqui. Significa que a cabeça deles tá sempre com pensamentos do nosso nível daqui e quando essas pessoas morrem vem pra cá. Já ouvi dizer que há outros lugares diferentes, mais frios, mais sobrios, mas não me interessou ir ver como é, além disso teria que abrir mão das minhas belas penas translucidamente azuis.
Tem comentários que há lugares mais altos (em nível energético) mas pra ir lá tem que ter uma plumagem mais difícil de consequir, acho que dei sorte. Vivi em alto-astral, até meditar, meditei, então, cá estou!
E essa história de Céu e Inferno? Me disseram os mais velhos e dos papos que pude ouvir dos humanos, que é tudo balela. Agora, purgatório é verdade! Segundo soube é pra onde vão os cães malvados. Deve dar uma coceira...kikiki
Bom, meu escrevedor já murmurou que tá cansado, então, encurtemos.
Um dia, talvez eu consiga mandar mensagens diretamente pro blog, talvez aprenda como fez Kimball O'Hara, o personagem do (maravilhoso) livro KIM, do (também maravilhoso) Rudyard Kippling, que usava escritores de cartas para mandar mensagens para seu mestre, até que aprendeu e chutou esses escrevinhadores...kikiki Fui!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Voltei

Fala sério, como é difícil achar um psicógrafo! Saí procurando, me mandaram a um psicólogo. Saí de lá com traumas de infância, dos outros...Vocês não imaginam o que sofre um falecido, pega tudo quanto é porcariada nesses lugares.
Depois me mandaram a um psiquiatra, pior, só tinha doidão, inspirei um lexotan e dormi (yes! We can!)uns três dias inteiros. Fui acordar com o sino dum anjo batendo ding! ding!
Procurei o Chico, ele tinha sido isso, mas ele está em local incerto e não sabido, ainda lembro da entrevista com ele, depois ele tomou o trem bão e foi trabalhar pra outras bandas.
A vida é dura depois da morte, viu?
Eu cheguei aqui machucado e assustado, depois fui socorrido por um ve-te-ri-ná-rio, um senhor velhinho que cuidou de mim até a nova troca de penas. Ah, aqui a gente (ainda não perdi esse hábito, de me achar gente) troca as penas. Só os pássaros, os humanos continuam com as mesmas penas que não cumpriram aí e terão de voltar pra cumprir.
Apesar de ter entrevistado em vida algumas personalidades mortas como Tim Maia e Chico Xavier, eu era um tanto cético quanto à vida post-mortem e reencarnação. Acreditava mais em vida porsche carrera e outros bens mais materiais. Mas, menino(a), nem te conto...virei crente pra ficar mais limpo, pois crente é anti-cético...kikiki
Bom, troquei as penas, que maravilha! Agora meu azul é brilhante como as asas das borboletas, não que eu tenha ficado menos macho, mas aqui tudo tem uma luz diferente.
Não tem mais obrigação de comer, no começo eu saia procurando comida, agora só pra enfeite, voamos mais livres.
Voar é mais fácil, parece que ficamos mais leves ainda, basta querer e voar.
Tem muitos humanos aqui, eu preferi ficar por perto do tal ve-te-ri-ná-rio porque ele parece alguém que eu conheço e tá sempre sorrindo e trabalha muito com humanos, passarinho, eu fui uma exceção, não sei por que.
Aí, perguntei ao dirigente dos passarinhos daqui se eu podia continuar minha carreira de reporter blogueiro e me foi negado, até que eu achasse quem psicografasse meus posts. Por isso demorei tanto pra voltar. Mas, agora estou de volta, do aquém do além e vou contar o que eu puder sobre mim e meus novos amigos e entrevistados.
Ah, já ia esquecendo, depois que morre todo mundo fica bonzinho, né? Pois saiba que isso é lenda, portanto, eu ainda tenho pena, mas não tenho dó! Kikiki
Bom, agora vai ser mais difícil colocar fotos e filmes meus, mas vamos ver o que podemos fazer.
Esse post já tá ficando grande e o meu (caríssimo) psicógrafo cobra por letra, então vamos ser mais curtos e grossos.
Me disseram que eu vim pra cá porque me tornei real, como na fábula de uma escritora inglesa de quem não lembro o nome. Um animal se torna real quando é amado. Quando ele morre ele se torna real e não precisa ir direto pra reciclagem da alma-grupo, recebendo penas (ou pelagem) novas, podendo até mudar de cor. Aí ele pode frequentar os sonhos dos humanos que os amaram e até esperá-los aqui pra recebê-los quando eles morrerem. Pronto! Falei!
Portanto, humanos, amem as baleias! Elas estão em falta nos mares aqui também.
Fui!