terça-feira, 31 de maio de 2011

A Festa


Hoje logo cedo eu voei para a árvore do Mocho porque, desde aquele dia em que ele leu a história, passou a ler outras para as aves daqui, agora com mais ouvintes. A notícia se espalhou e apareceram alguns gatos, cachorros, coelhos e outros bichos de estimação. Quem não gosta de histórias?
Quando eu cheguei, todo mundo já estava lá, olharam pra mim e seguiram o Mocho cantando:
-- Parabéns pra você! Nesta data querida! Muitas felicidades, muitas felicidades!
-- Uai, não rimou! Eu disse
-- Felicidades Ding! Gritaram todos!
-- Mas, por que? Eu sou de setembro!
-- Não, Ding, falou meu amigo Tico-tico, hoje faz um ano que você morreu e veio pra cá!
-- Ah, é! Nossa, nem me lembrava.

Em minha homenagem, o Mocho leu a MINHA história, e eu fiquei pensando: "Nossa, eu já esqueci disso tudo. Nem lembrava mais dos meus humanos."
Nesse momento, o Mocho que é muito sabido, parece que ouviu meus pensamentos e disse:
-- É que você anda muito ocupado por aqui, Ding, por isso não lembra dos seus humanos lá na Terra física. Mas seu humano número um lembra de você todos os dias, até colocou sua foto num cartão de plástico que ele sempre carrega com ele.
-- Puxa! E eu nem posso ir ver como ele está.
-- Mas pode ir nos sonhos dele, se quiser. Depois te ensino como fazer isso, agora deixe eu terminar a história.

Até parece que ele andou lendo meu blog, esse Mocho safado!

Depois da história, vieram todos me cumprimentar, até lambida eu tomei, que nojo! E os gatos fizeram uma apresentação da banda deles, cantando, ou melhor, miando juntos. Até que ficou legal, mas tinha um amarelo que era bem desafinado.
Teve brincadeiras durante a manhã toda e aquela balbúrdia atraiu a atenção até dos humanos, que passavam sem entender nada.

Finalmente, o Mocho me chamou, subimos a um galho bem alto e ele me explicou como funcionam os sonhos dos humanos e me deu uma porção de recomendações, acabei achando meio complicado.
-- Não se esqueça que, por causa do seu amor aos seus humanos e do amor deles por você é que você está aqui. Foi um passo muito importante. Daqui uns tempos, quando os pensamentos deles relacionados a você se gastarem na matéria deste lugar, você vai dormir e acordar num outro lugar, onde vai receber uma estrelinha, na verdade você já é essa estrela. Depois, passará, como estrela de volta ao mundo físico, carregando alguma matéria daqui e dacolá, para formar a nova estrutura com a qual você vai funcionar lá.
-- Puxa, que complicado, isso dói?
-- Não! Disse o Mocho rindo da minha ignorância.
-- E eu vou ter penas azuis ou verdes?
-- Creio que seu corpo talvez não tenha penas, mas vai ser o adequado para sua individualização.
-- Como assim?
-- Não sei, Ding, isso faz parte dos Mistérios e nem eu conheço.
-- To sentindo um aperto no peito. Será medo?
-- Não, talvez seja outro sentimento. Os humanos chamam de saudade.

Saí dali voando e fui pousar numa pedra de onde se vê longe, um vale bonito com um rio brilhante, que faiscava com a luz do sol. Fiquei lá, só olhando, até o sol descer, e meu aperto no peito foi passando, passando...

segunda-feira, 16 de maio de 2011

A AULA



O Dirigente dos passarinhos daqui é um mocho velho, um tipo de coruja grande que tem penas pontudas que parecem orelhas. Isso significa que ele está sempre atento ao que fazemos aqui e de vez em quando reúne a passarada e outras aves para uma aula.
Distante um voo pensamento fica uma construção redonda onde os humanos tem aulas, oferecidas por humanos mais experientes.
Fomos para lá, em bando.
O Mocho falou: Atenção todos, vamos assistir a uma parte da aula dos humanos, não quero ouvir um pio sequer!
Os humanos foram chegando e sentando em bancos que formavam círculos concêntricos, nós aves nos encarapitamos no muro, já que a construção é aberta, sem janelas e tem um muro baixo em toda a sua volta.
Depois de uma oração feita em grupo, os humanos ficaram quietos por um tempão, como se estivessem recebendo os benefícios dela. Tinha uma luz azul em toda a volta da sala, dentro e fora, muito bonita, como se fosse uma nuvem azul, mas transparente.
Olhei em volta e vi que todos estavam quietos, até os patos e os marrecos, geralmente muito barulhentos.
Nenhum pio! A ordem do nosso dirigente estava sendo cumprida

O professor começou a falar:
"Tudo é uma só substância da qual tudo foi criado e pela qual toda vida se sustém. Tudo tem vida e não há ponto algum onde não exista a vida. Toda coisa tem forma corpórea, através da qual o Espírito e a Vida tem que se expressar. Algumas formas são visíveis e outras invisíveis, mas todas são corpóreas."
"A substância mental está em todo lugar. Podemos considerá-la como se fora a parte mais elevada da energia, assim como a matéria é face mais grosseira da energia ou substância mental. Da mente emanou a energia e da energia, a matéria."
"As diferenças são:
1. Matéria... É o que usamos para vestir-nos.
2. Energia... É o que usamos para acionar e obrar.
3. Mente... É o que usamos para pensar.
4. Toda mente está em contato com toda outra mente e com a Mente Universal, da qual todas as mentes são partes.
5. O Universo é uma substância pensante.
6. O pensamento pode variar como varia a forma corpórea, desde o átomo até o sol.
7. A forma de pensamento mais perfeita de que temos conhecimento é a do homem.
Logo: Hoje somos o que temos pensado sempre."

Olhei para um sanhaço que estava com os olhos fixos no professor e o bico entreaberto, quase babando e falei:
-- Num tendi nada!
-- Shhhhh! Fez o Mocho. Depois, fez o sinal que já tínhamos combinado e fomos todos voando para debaixo de uma árvore.
Lá, ele disse:
-- Ding! Eu falei nenhum pio e você piou! Por isso, hoje todos só vão ficar com isso o que foi dado.
-- Mas eu não entendi mesmo, repliquei.
-- Não importa! Às vezes, ouvimos ou presenciamos coisas que não entendemos e, mais tarde, isso vai ter um significado para nós.
-- Hoje, continuou o Mocho, pigarreando, vimos um pouco da aula dos humanos, talvez um dia vocês venham a entender isso, talvez na forma de uma lembrança, ou de um pensamento.
-- O que é pensamento? Perguntou um papagaio.
-- É a ação da energia através de um instrumento que nós, animais, ainda não temos desenvolvido totalmente, nós estamos desenvolvendo as emoções, mas uma grande parte de nós, aqui presentes, estivemos envolvidos pela energia mais elevada que é a substância mental quando interagimos com os humanos. Respondeu o Mocho.
-- Não entendi nada! Falei, de novo.
-- Não importa, como eu disse. Um dia tudo isso vai voltar quando você desenvolver o instrumento necessário para responder a esse grau de energia. Respondeu o Mocho.
-- Veja bem, continuou. Quando você quer voar aqui, de um ponto ao outro, o que faz?
-- Força! Respondi
-- Sim, mas aaaaantes disso?
-- Não sei, dá uma vontade de estar lá para onde eu quero ir voando. Respondi
-- Isso! Isso é um pensamento na sua forma mais primitiva. Isso é tudo o que você pode fazer agora, mas da próxima vez, tente saber, ter consciência do que está fazendo.
-- Como o Fernão Capelo Gaivota?
-- Sim, essa criação fantástica de um ser humano explica bem quando um ser começa a evoluir, deixar de buscar apenas a satisfação material das suas necessidades básicas, comida, por exemplo e começa a descobrir que voa, que pode voar e isso lhe dará condições de juntar substância mental.
-- Nossa! Exclamaram alguns, outros só ficaram olhando.
-- Como é essa história, velho Mocho? Perguntou um pica-pau.
-- Eu vou ler pra vocês, deixa eu pegar meus óculos e o livro.

E ficamos todos embevecidos com a leitura da história.
Eu, que já sabia um pouco do livro, fiquei distraído, lembrando das palavras do professor humano e, de vez em quando soltava sem querer, um "não entendi nada"
-- Não entendeu o que? Perguntava o Mocho enquanto dezenas de olhinhos viravam pra mim com reprovação.
-- Não...continue, por favor?! Eu dizia todas as vezes enquanto sorria por dentro...
Eu tenho pena, mas não tenho dó! kikiki!