sexta-feira, 11 de março de 2011

O Boi Falô

Gostei tanto da biblioteca que resolvi voltar, lá tem sempre alguma coisa prá gente aprender.
Quando cheguei à sombra da Teca, hoje tinha pouca "gente", uns gatos pingados...kikiki...adoro esta expressão.
Foi quando eu vi o boi, sim! Um boizão de verdade, com a maior cara de vaca da Índia, deitado na sombra, mascando como fazem os bois. Ele era enorme, da cor de creme, tinha chifres enormes e uma marca no pescoço, como se o pelo tivesse sido raspado ali.
-- Olá, boi-bumbá, você é garantido ou caprichoso?
O boi ficou olhando pra mim e mascando com aquela cara bovina de "ué!", pelo jeito não falava a minha língua. Tentei de novo.
-- Olá Seu Boi, o que faz um boi aqui onde só chegam as criaturas da mente humana e entes folclóricos?
-- Olá passarinho! Eu sou um ente folclórico. Eu sou o Boi Falô.
-- Como?
-- Sou personagem de uma história que aconteceu há muitos anos numa fazenda chamada Santa Genebra em Campinas.
-- Ah! Conta!
-- Então, era dia santo, e o capataz mandou um escravo chamado Nêgo Toninho atrelar os bois de carro pra fazer um serviço e eu me recusei a trabalhar. Quando o Nêgo Toninho foi dizer pro capataz que os bois não queriam trabalhar, que era dia de se guardar, acabou sendo surrado violentamente e veio a morrer por causa disso. Nessa hora eu ajoelhei e falei: "Hoje é dia santo, é dia de se guardar", imagina o susto do capataz e de quem tava lá perto.
-- E falou mesmo, como gente?
-- Dizem as más línguas que não, que o cavalo era ventríloquo. Moo! Moo! Moo!
-- Kikiki!
-- Então, depois disso, essa região que recebeu o nome do dono da fazenda, o Barão Geraldo de Resende, virou a "terra do Boi-Falô".
-- E desde então, você virou mito e veio pra cá.
-- Vim e tenho observado demais os humanos, que não guardam nem dia santo, nem respeitam nada, são os seres mais violentos que há.
-- É?
-- É, passarinho! Você não imagina a crueldade com que eles matam os animais nos matadouros, um horror.
-- É?
-- É! Eles dão choques com aguilhões eletrificados e os animais ficam com tanto medo que evacuam e urinam, com tanta adrenalina que é descarregada, um caos total.
--Nossa!
--E na hora de matar, todos os animais assistindo tudo, percebendo que sua hora vai chegar, vem um ser que se diz humano e bate com marreta na cabeça do bicho, bate muitas vezes. Uma dor lancinante.
-- E por que eles fazem isso?
-- Pra ganhar dinheiro. Porque os humanos comem os cadáveres dos animais, usam couro pra fazer roupas, tapetes, móveis, bancos de carro. Usam os ossos pra fazer gelatina.
-- Que nojo!
-- É um grande negócio criar e matar bois, aves, porcos, ovelhas, cabras. Muitos humanos ficam se sentindo melhores quando tem o tal dinheiro, então não ligam para isso, a dor dos animais não os afeta.
-- Que tristeza!
-- Pior passarinho, isso não acontece só com esses. Na pesca de arrastão para pegar camarões, são jogados fora mais de 80% dos animais marinhos que ficam presos nas redes e morrem. Estima-se que morram todo ano na Terra 4,5 milhões de animais marinhos, 3,3 milhões de tubarões, 60 mil tartarugas marinhas e 20 mil golfinhos e baleias. *
-- Ai, que dor no meu coraçãozinho.
-- É, passarinho, depois os humanos chegam aqui e tenho observado que eles sofrem essa pressão, quando tomam consciência que não fizeram nada quando podiam, ficam sofrendo por remorso.
-- E por que não fazem nada?
-- Alguns vivos ainda brincam dizendo que amam os animais porque eles são deliciosos.
-- E eles têm que matar pra comer?
-- Não, passarinho, só alguns animais matam para comer, mas isso é da Mãe Natureza, eles fazem isso porque foram criados para isso, para fazer a seleção natural das raças e não por crueldade.
-- Ai, ai, ai!
-- Os humanos que são criadores e matadores de animais não falam nada, não divulgam e os humanos comedores de cadáveres procuram ignorar, se esforçam mesmo pra isso.
-- E comer cadáver não faz mal?
-- Faz, mas aos pouquinhos, além das químicas que os criadores colocam nas rações para os animais engordarem e crescerem mais depressa, a adrenalina entra na carne, penetra nas células e essas se modificam e quando o animal morre impregnam tudo, isso tudo que o homem come, carrega todo aquele sofrimento para as células humanas, algumas que estão nascendo podem nascer defeituosas e se transformar em câncer.
-- Nossa Boi Falô, você é sabido, hein?
-- Sou não, pois não te disse que fico aqui observando os homens e ruminando o que eles dizem?
-- Pois é! Essa foi uma das conversas mais tristes que tive aqui
-- Verdade, suas penas até perderam um pouco de brilho.
-- Obrigado pela aula Boi Falô.
-- Volte sempre, passarinho.

É, o Boi Falô!




(*) Matéria da Carta Capital

Para saber mais sobre esse personagem, clique AQUI.

Um comentário:

Antonio Bedran disse...

HPB. Só lembro dela nessas horas. Mais de um século depois e ainda não temos pelo menos um abate menos cruel. Doloroso.